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PINTASSILGO E JACUTINGA! TAMANHO NÃO É DOCUMENTO.

E NA PALMA DA MÃO POUSOU UM PINTASSILGO
Entre duas e quatro horas da tarde, abre-se no mundo um oco profundo.
O pensamento fica bobo e vagabundo. E nossas almas despencam no abismo. Fazer o que nessa hora se até o Sol parece sem tino, destino, parado em si?
Então, na palma da mão pousou um Pintassilgo. Não cantou. Era uma sombra. Bateu asas e voou.
Pintassilgo parece uma coisa à toa, mas como é que a gente voa quando começa a pensar.
Que horas são?
O mundo da rua Pintassilgo muda de meia em meia hora.  Mas, só antes das duas e depois das quatro é que muda. O corte de cabelo, também. Mas, dos Hair-Centers os cabelos não saem a voar ao vento como antigamente.
As mulheres que voam na Pintassilgo agora são bem poucas e se escondem das outras, usam toucas, Mona Lisas evasivas.
E quem pensa que beleza não dói nunca fez depilação. Pelo. Um pelo outro. Pelos. Por que tê-los? O pelo é um chato, o grande pentelho na vaidade da mulher. E ai do aventureiro que se atrever a brincar de tirar um só, num bem-me-quer, mal-me-quer.
Pela beleza da mulher tantas coisas foram pinçadas da Pintassilgo.
Pelo pouco que sobra agora, é fácil imaginar quanta coisa foi embora.
Que horas são?
Alguns sobradinhos geminados, fora do tempo, ainda lembram manhãs da Pintassilgo, serenas manhãs, quando o pão e o leite eram deixados no portão e não passava ladrão.
O Cofee Break virou a mesa. Dos Jardins Suspensos da Babilônia descem para grandes e sofisticados espaços os conquistadores de uma nova era. E não importa se for apenas quimera.
Ninguém ousa pedir o bucólico pão com manteiga ou o inocente café com leite de todas as manhãs. É coisa da plebe e a plebe é brega, pensam os que não têm mais olhos pra ver.
Mas, a vida é cheia de ironia. E a rainha da mesa, quem diria, é a melancia, uma das raras coisas de que os pobres pegam uma fatia.
Os entregadores de água passam em suas bicicletas, com boca de café requentado e a plena consciência de que na lei do equilíbrio o peso maior pende para o lado mais fraco. E vão em frente a pagar o pato.
Também paga o pato a dona daquela pequena oficina de costura, que pode fechar a qualquer momento.
---Rico não tem remendo, lamenta.
O segredo é ser indiferente para nada doer na gente. Esse o conselho de um sapateiro, que ouviu do pai que na vida tudo tem conserto.
Se remorso já temos tanto, que tal um doce de confeitaria sem nenhum sentimento de culpa?
Que horas são?
É gostoso, às vezes, perder docemente a força de vontade.
O que seria de Deus sem nossos pequenos pecados?
Sem nenhum sentimento de culpa, que Divindade os homens buscariam? Ainda estariam cavalgando a própria sombra numa caverna grega. E quem sabe seriam mal humorados e insuportáveis pelo ascetismo, que rima com cinismo.
Verduras, frutas, legumes, cereais.
Anjos e passarinhos adoram.
Só três e meia ainda?
O problema é que o diabo sempre aparece nessa hora.
Às vezes, com uma taça de sorvete.
Se cair em tentação, faça como Freud: ponha a culpa na mãe.
Quem adoçou nosso leite e nos deu o prazer da mamadeira?
Quem sempre compensou com um bombom os seus beliscões?
Quem nos deu a chupeta, que é a desculpa freudiana do nosso cigarro?
Esqueça o regime ou a análise e peça um brigadeiro.
Lembre-se de que médicos e analistas que proíbem o doce talvez, deitados no sofá, abracem ursinhos de pelúcia para compensar uma eventual falta de carinho.
Agora, um segredo, para ninguém espalhar. Existe nos arredores da Pintassilgo um advogado que tira cópias de chave apenas para deixar a impressão de que existe mais alguém em sua vida. O chaveiro apenas faz as chaves, porque nada entende de carências.
Ah, esse oco profundo entre as duas e quatro horas da tarde, quando nossas almas caem no limbo e o pensamento fica bobo e vagabundo.
É certo que entre duas e quatro horas da tarde de dias incertos, a gente se sente como aquele pé de manga na calçada da rua Pintassilgo. Solitário e fora de lugar. Então, é bom acender um incenso para a deusa Kuanin, a que ouve os prantos do mundo, e cantar, com um pouco de mansa loucura:
Sem medo da vida
Sem medo da morte
Sigo meu destino
Pego minha sorte
E sei que a dor
É a parceira do amor.

Que horas são?
Quatro horas.
Graças a Deus.

 

Jacu??? Tem o jeito de quem caiu em tentação e ficou inadimplente depois da quinta prestação.

Pintassilgo??? Parece uma coisa à toa, mas a gente voa quando ele começa a cantar.

E quem pensa que beleza não dói nunca fez depilação. Pelo. Um pelo outro. Pelos. Por que tê-los? O pelo é um chato, o grande pentelho na vaidade da mulher.

Cachorro é um apêndice que deixa em certo desacerto cabeça, tronco e membros da antiga espécie humana. Em Moema, nosso novo corpo também é constituído de cachorro.

Dá um frio na barriga temer o destino erradio de antigos andarilhos de Moema. Eles catam bitucas no chão e pedaços de pizza no lixo. Mas, não têm medo da vida nem de gente e se viram pela Jacutinga, vira-latas.Pelo sorriso que levam no seu jeito de ser, parece que a infelicidade dos outros é o velho problema de ter.
 

​CARA DE JACU NA JACUTINGA. NUNCA VIU?

Jacutinga. Nunca viu?
É um grande Jacu em preto e branco.
Jacu. Nunca viu?
É da família das galinhas, pelo lado pobre. E dos perus e faisões, pelo lado nobre.
Cara de Jacu. Nunca viu?
É a cara de gente que caiu em tentação e ficou inadimplente depois da quinta prestação.
Cara de Jacu na Jacutinga. Nunca viu?
Às vezes passa e fica à sombra de um pé de amora, sem asas para dar o fora.
O Guia de São Paulo não informa as saídas para a inadimplência. Nem adianta pedir ao jovem que pára com um Guia à vista na mochila e vai embora depois de colher amora.
Dá um frio na barriga temer o destino erradio de dois antigos andarilhos de Moema. Eles catam bitucas no chão e pedaços de pizza no lixo. Mas, não têm medo da vida nem de gente e se viram pela Jacutinga, vira-latas.Pelo sorriso que levam no seu jeito de ser, parece que a infelicidade dos outros é o velho problema de ter.
O bom andar na Jacutinga é o andar quase parado. E contemplar sem pressa as rosas no jardim de um consultório de dentista. Onde existem rosas qualquer dor dói menos.
No ponto de táxi percebe-se que a corrida de alguns motoristas foi longe demais. Os cabelos que não caíram pelo caminho voltaram brancos. Eles riem do tempo.
Mas, seriedade e preocupação pairam sobre a mesa de um Café. Um executivo tem seu lap-top ligado nas metas do dia. Ai de quem não cumprir e, ai, como é bom andar quase parado e contemplar sem pressa todas as flores à venda numa das vitrines da Jacutinga. As que não estão à venda são amarelas e cobrem varanda e janelas de uma casa símbolo de resistência ou cheia daquela velha paciência de esperar o tempo passar.
Seria bom que naquela loja de alta costura ninguém se sentisse fora de moda. Nem mesmo quem prendesse nos cabelos uma flor amarela.
E no bazarzinho com roupas em liquidação por poucos reais, que nenhuma mulher perdesse sua nobreza nem seu jeito suave de ser.
Quanto a ficar sem jeito nas aulas de natação e hidroginástica, já é coisa corriqueira.
Ultimamente, homens e mulheres têm no corpo um quê de desacerto.
Surgiu um apêndice na extensão do braço ou bem junto ao colo, com formas e tamanhos desiguais.
É uma coisa assim histriônica, que mexeu com a anatomia dos que eram simplesmente constituídos de cabeça, tronco e membros.
Nem todos parecem bem adaptados. O apêndice tem autonomia. Ele baba se está com sede. Brinca de morder e às vezes morde sem brincar. Gosta de pular nas outras pessoas. Mexe no lixo. Rói móveis e porta-retratos ao alcance.Não segue horários convencionais do metabolismo humano. Tem total intolerância aos gatos. Enfim, é um apêndice que deixa em certo desacerto cabeça, tronco e membros da antiga espécie humana de Moema, que hoje tem o corpo também constituído de cachorro.
Darwin jamais imaginaria uma coisa dessas. Quem perdeu o rabo na evolução da espécie, pegou o rabo de volta. O rabo e muito mais.
Essa transformação deixa professores e instrutores sem saber o que fazer com os seus alunos de natação e hidroginástica.
É que nas piscinas cachorro não entra e os alunos se sentem deformados e incompletos.
Já se pensa em raias e áreas especiais.
Alguém deve ter feito as contas.
Os de cabeça, tronco, membros e cachorro compõem extraordinária faixa de clientes potenciais. E a tendência é de crescimento.
Mas vão permitir a entrada de pessoas com esse apêndice na piscina?
Os sábios gregos já diziam a seus discípulos que bem de direito é o bem da maioria.
Além disso, milhares de pelos de cachorro desprendidos ao dia, abririam mais ofertas de emprego aos limpadores de piscinas.
Quanto aos demais, com o corpo ainda sem cachorro, não só perdem em quantidade como já não sabem mais o que fazer de braços e colos desocupados, que provocam dolorido vazio existencial.
(miguel arcanjo terra)

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