









moema bem-te-vi
moema bem-te-vi
miguel arcanjo terra
ÁS VEZES É BOM FICAR NA MOITA
COMO UM INHAMBUBU
O Inhambu parece um frangote.
Mas, ai, que lhe falta o rabo --- observou o primeiro conquistador português que o avistou atrás da moita.
Com tanto rabo preso por aí, isso é uma vantagem.
Quem tem ou já teve o rabo preso, sabe muito bem do que se trata.
Rabo preso ou rabo entre as pernas é quase a mesma coisa.
Que bom ser Inhambu e jamais andar com o rabo em perigo.
Inhambu Xitã ou Xororó.
Que bom, conforme as circunstâncias, ficar na moita de vez em quando.
Vale até como terapia em nossa insensatez.
Embora não exista moita na rua Inhambu nem psicoterapeuta que a recomende, trata-se de um ponto de equilíbrio para homens e mulheres antes do bronzeamento artificial no próximo quarteirão.
O bem que faz ficar na moita e a alegria de sair, só Freud explica.
Tudo fica diferente quando a gente volta a ser gente.
É gostoso entrar no pet-shop com a plena certeza de que se um cachorro morder você, você não vai morder o cachorro.
Que bom passar na loja de roupas para crianças e não sentir mais falta do colo da mãe.
Na Inhambu, sair da moita significa procurar a esquina onde está estacionada a velha Kombi azul do vendedor de flores e comprar vasinhos de violetas, margaridas, crisântemos e torcer com ele para que o fiscal da Prefeitura nunca saia da moita.
No cabeleireiro da Inhambu é bom saber que a dor de cotovelo já passou, tudo passa, e ela ficou mais linda.
Que bom é sair da moita como um homem senhor de si, não mais cara-pálida, e no açougue mostrar-se expert em picanha, com toda a segurança, boca firme e seca. Só os carentes é que babam.
Na ida e vinda do Cooper, no sobe e desce da rua, os conselhos de um velhinho, que estava à porta da casa de chocolate fundada em 1.928:
---Se você está prestes a entrar na moita ou acabou de sair, disfarce, endireite a coluna, erga a cabeça e não deixe a impressão de que vai cair de quatro no próximo passo. Também desvie o olhar das cortinas, persianas e sofás em oferta na Inhambu. Essas peças tentam a gente a ficar na moita.
Não se impressione com o vazio daquele prédio comercial de tijolos aparentes. Todos de lá, não se sabe quantos, entraram na moita sem passar o ponto. Não há previsão de saída. Se você sentir um vazio no seu estômago, não ligue. É só uma projeção psicológica, uma questão oral-receptiva, que é o medo de passar fome, morrer à mingua. Vazio no estômago analista cura e não tem nada a ver com estômago vazio. Eu Só Quero Chocolate. Cante com Tim Maia, apanhe sua sacola de roupas sujas e passe na lavanderia. Depois, deixe o carro no lava-rápido. Siga a pé e tente localizar uma imensa figueira na Inhambu. Se você não encontrar, pergunte às pessoas que freqüentam o boulevard, as butiques, a loja de tapetes, enfim, suba e desça a Inhambu de ponto a ponto. Se você não descobrir a figueira nem sua sombra generosa, eu garanto uma coisa: você vai se descobrir a si mesmo fora da moita. E isso é tão gostoso como chocolate.
Sábio velhinho.
